Inominável
Sinto as palavras enfraquecidas
Como se fossem insuficientes os sentidos
Vejo a rima e a métrica arrefecidas
E a poética a procura dos tesouros escondidos
Teu som cala os lábios e põe o riso nos cantos
Figura que irrompe a manhã e afugenta o sol dourado
Que busca outro infinito e cede a vez aos teus encantos
Para admirar tua luz qual dia ensolarado
Para explicar-te faltam letras, siglas, orações
Signos, códigos, fórmulas, funções, teoremas
Nem a rica metalingüística, lenitivo dos corações
Traduz teu tom que silencia todos os fonemas
Tua dança é branda pantomima indecifrável
Talvez análoga ao balé das folhas ao vento
Uma fonte de magia, na candura mais afável
Ou serás, vertiginoso, o próprio ar em movimento?
Em tua pele, cobre estonteante, os anjos hão de repousar
Loucura que atordoa a língua mãe, em verso e prosa
A lua em milhões de fases crescentes a vislumbrar
Tua tez, macia gabardina, a desvendar meu cor de rosa
Tua forma primorosa de salobro delineamento
Representa os traços da arquitetura magistral
Povoa-me inteira, plural do meu contentamento
Deleita a mente do poeta o saboroso madrigal
Aprendi que não há tempo nem modo, ciência ou exatidão
Tudo é haplologia restritiva de qualquer sentido
Indizível é sua figura em sua terna amplidão
E o teu amor lanceando meu peito, antes adormecido.
sexta-feira, 29 de maio de 2009
quinta-feira, 7 de maio de 2009
Um dia de cada vez
Você:
Hoje eu acendi a luz. Deixei pra trás o negror dos tempos onde o homem era um vestígio frívolo da incapacidade de se amar. Puxei o ar que, castamente entrante, escorregou por minhas narinas e cumpriu, enfim, seu destino.
Eu:
Eu:
Hoje estendi a mão. Tornei impraticável uma desdita. Segurei da forma como pudera e o mais que conseguira o gosto pela vida, que se fizera amargo. E na superfície nada plácida, ergueu-se o rosto à procura pelo belo açúcar.
Você:
Você:
Hoje me levantei. E dando conta de toda sujidade, olhei minha vestimenta impura e desejei uma fonte para banhar-me. Uma fonte sobrenatural que atingisse o princípio de vida, de uma criatura que ainda tem tanto para avançar e perdurar.
Eu:
Eu:
Hoje desenhei uma chama. Alimentei com vivacidade uma esperança. Fiz a santa escolha pelo pavio aceso. Estive nos lugares obscuros e retornei ao dia claro, com você pelas mãos. Então, olhemos essa claridade, pois assim compreenderemos que o fogo vai tornar mais puro o viver.
domingo, 3 de maio de 2009
Encantamento
A voz fascina. Por ser a extensão dos pensamentos é capaz de capturar os sentidos, lancear um coração que bombeia atônito, se fazendo ouvinte paralisado das doçuras emitidas. Essa manifestação, dita verbal, transcende os fonemas e atinge não só os tímpanos. São beijos que percorrem as veias e fazem o corpo transpirar, pois ele é também seu súdito e interlocutor. Usando uma linguagem específica, traça um saboroso diálogo cheio de signos.
A palavra dita é uma semente plantada. Pobre dos covardes que não se permitem a bem aventurança da fala. Coitados são aqueles que aprisionam as interjeições tornando rasa a profundidade de um suspiro. Quem mantém em cárcere o aparelho fonador pode emudecer de vez e de tristeza ao perceber que a vida, antes articulada, perde em detalhes sutis sua forma de canção. Fica tudo pelo não dito e a poesia a esvair-se inteira.
Uma sugestão íntima enternece os ouvidos, sem contar o paladar adocicado que deixa na foz de seu prenunciador, realizado por externar seu anseio e por ser sua aglutinação de sons um mecanismo tradutor de si mesmo a entorpecer o alheio. É um toma lá dá cá dos mais aprazíveis, esse fluxo e refluxo.
Eu, mortal, uma reles que padece da necessidade de capturar a propagação das ondas sonoras, me enterneço e sonho ser anjo cada vez que meu pavilhão auricular pressente os vocábulos aspergidos pela boca perfumada de quem bem os diz. E me pego brincando a tagarelar com as aspirações que migraram para dentro de mim quando bateram a porta de meus ouvidos.
A palavra dita é uma semente plantada. Pobre dos covardes que não se permitem a bem aventurança da fala. Coitados são aqueles que aprisionam as interjeições tornando rasa a profundidade de um suspiro. Quem mantém em cárcere o aparelho fonador pode emudecer de vez e de tristeza ao perceber que a vida, antes articulada, perde em detalhes sutis sua forma de canção. Fica tudo pelo não dito e a poesia a esvair-se inteira.
Uma sugestão íntima enternece os ouvidos, sem contar o paladar adocicado que deixa na foz de seu prenunciador, realizado por externar seu anseio e por ser sua aglutinação de sons um mecanismo tradutor de si mesmo a entorpecer o alheio. É um toma lá dá cá dos mais aprazíveis, esse fluxo e refluxo.
Eu, mortal, uma reles que padece da necessidade de capturar a propagação das ondas sonoras, me enterneço e sonho ser anjo cada vez que meu pavilhão auricular pressente os vocábulos aspergidos pela boca perfumada de quem bem os diz. E me pego brincando a tagarelar com as aspirações que migraram para dentro de mim quando bateram a porta de meus ouvidos.
sexta-feira, 1 de maio de 2009
Divina Promessa
A estiagem pode desacreditar as pedras, antes acoitadas e submersas, limpas e purificadas de tanto que as águas, obstinadas, lavam e relavam o natural objeto , ali imóvel.
Contudo, o sol vivaz lhe oferta seu porte único e imprime um novo advérbio de modo. Ali, naquele instante, a totalidade das coisas passa a ter o gosto de uma divina e abrasadora promessa.
A estiagem pode desacreditar as pedras, antes acoitadas e submersas, limpas e purificadas de tanto que as águas, obstinadas, lavam e relavam o natural objeto , ali imóvel.
Contudo, o sol vivaz lhe oferta seu porte único e imprime um novo advérbio de modo. Ali, naquele instante, a totalidade das coisas passa a ter o gosto de uma divina e abrasadora promessa.
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